quarta-feira, 15 de julho de 2020

Porta-retratos...

Há alguns anos viajei para outro Estado em férias, para me permitir ficar ao sol e beber água de coco enquanto contemplasse as ondas do mar, sem me preocupar com as horas.

Coisa boa é poder estar dentro de outras culturas, ainda que não seja fora do País. Gosto de conhecer novos aromas, novos sabores e claro, novas pessoas. A raça humana em todo o seu eclético estilo de vida, conceitos, valores, sempre me inspiram boas histórias.

Nessa viagem, conheci Franciscleyde, uma mulher casada, mãe de um casal de filhos, por volta de seus vinte e nove anos, dona de uma cadela da raça Pinscher, que dispensa comentários, chamada Dalvanira, morando em um bairro nobre da capital do Estado.

Visitei a casa de Francis, como era carinhosamente chamada pelos mais próximos, para um café da manhã, pois em seguida, ela e a família me levariam para conhecer pontos turísticos e uma praia deserta em um local paradisíaco. 

Reparei na sala de Francis, enquanto a aguardava, em uma estante de madeira antiga e escura, uma infinidade de porta-retratos. Não conseguindo identificar nenhum de seus familiares ali, resolvi perguntar quem eram aquelas pessoas no momento em que ela veio me cumprimentar. Para a minha surpresa, Francis me explicou que simplesmente comprara os porta-retratos exatamente pelas imagens que estavam ali, que em sua opinião eram bonitas. Eram as fotos perfeitas em um mundo perfeito. Concluiu dizendo que gostaria de ser como aquelas mulheres ou ter famílias como aquelas. 

Fiquei chocada e ao mesmo tempo sem saber o que dizer para Francis. Não a julguei, não dei-lhe lições de moral ou qualquer coisa do gênero. Eu sorri, coloquei um de meus braços sobre seus ombros e perguntei sobre o café da manhã. Em seguida ela me levou para uma sala, onde sua família já nos aguardava.

Café da manhã dos bons, deferente aqui do Rio. Jambo, suco de caju, cará, macaxeira, leite, cuscuz, manteia de garrafa... E para levar em nosso passeio até a praia deserta, Susi (apelido de Lidinalva), a empregada, separou alguns mariscos no molho de coco e outros no de tomate, caranguejo, umas latinhas de Pitu (eu nem bebo), refrigerante, bolo de chocolate e para me agradar, uma feijoada. Tudo isso arrumado, com todo o carinho e a fartura da hospitalidade e amor que os nordestinos possuem.  

Bem diferente do cardápio carioca. Eu confesso que me limitava aos picolés e sanduiches naturais vendidos nas praias do Rio, o que me fez lembrar de uma senhora , vendedora ambulante, certa vez, em Grumari, vestida de vaquinha e da Kombi, o carro da pamonha e cural, que na minha opinião se tratava de uma multinacional, pois passava em todos os lugares do Rio, com a mesma gravação emitida pelos auto-falantes presos no teto do veículo.

Voltando à Francis e sua família, tirei muitas fotos deles juntos e separados naquele dia. Depois coloquei em porta-retratos e dei-lhe de presente no final de minha viagem. A melhor parte foi ver a expressão dela percebendo o quanto eram fotogênicos. As fotos ficaram realmente lindas. Antes de ir embora, as vi uma a uma ocupando o lugar das outras na estante e fraguei Francis algumas vezes fazendo selfies com caras e bocas, enviando em seguida para o marido no escritório onde ele trabalhava.

Não sei em que parte do caminho Francis perdeu a beleza do olhar em relação a si mesma e a sua família. Talvez tenha se casado jovem demais e esperava viver uma vida como nas telenovelas ou nos filmes de Hollywood.

A gente tem dessas coisas na adolescência. De querer ser igual a alguém famoso ou de se casar com um dos integrantes do Menudo, mas tudo isso passa né?

(pausa pra pensar)

Eu acho que seu tivesse o bumbum e as pernas da Beyocé, a boca da Joly, os cabelos da Gisele, a cintura e os peitos da Barbie... Eu ficaria muito melhor.  Sei lá,  talvez eu me tornasse uma espécie de noiva do Frankenstein, com uma beleza monstruosa.

(brincadeirinha)

O que eu aprendi com Francis?

Se ame acima de tudo, se sinta na hora de fazer uma fotografia. Transborde beleza. Contagie, inspire.

Às vezes passamos tempo demais sonhando, idealizando e a gente se esquece de ser feliz. De fazer do que temos ou somos,  nossas pequenas felicidades certas, imortalizadas pelas lentes de uma câmera que congela o momento fora dos arquivos da memória. Pra que os nosso olhar visualize e faça nossa mente lembrar do que foi bom, que é e que pra sempre será, construindo a nossa história. 

Não se reprima.

Cris M C Ramos

 

PS.: Alguém sabe se aquele garoto moreninho, aquele que tinha uma falha no dente da frente, que era o meu preferido do grupo está solteiro? Só pra saber mesmo.


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